Farmacopeia dos EUA (USP): Ciência e resiliência diante da turbulência global

Enquanto as políticas e tarifas propostas por Donald Trump ganham as manchetes nos Estados Unidos, cientistas e acadêmicos da área da saúde mantêm os olhos no horizonte, buscando colaborar além das fronteiras e garantir que medicamentos de qualidade continuem sendo a base da saúde global — para todas as pessoas do planeta.
A convenção da Farmacopeia dos Estados Unidos (USP), realizada de 5 a 8 de maio de 2025, reuniu centenas de representantes de todo o ecossistema de saúde e ciência dos EUA, sem se distrair com o barulho de interrupções geopolíticas, crises de saúde e debates protecionistas. Entre os elementos destacados para o futuro imediato estão: mitigar o risco de desabastecimento, manter a qualidade dos medicamentos, otimizar preços, promover medicamentos biossimilares e expandir a digitalização.
O evento contou com o diálogo entre instituições acadêmicas, associações de fabricantes, agências governamentais, ONGs, organizações de pacientes e profissionais de saúde, buscando traçar um caminho em direção a um fornecimento global de medicamentos mais resiliente, sustentável e equitativo — algo que deve ser de grande interesse para o México como parceiro comercial e país vizinho. Entre os pontos mais impressionantes está o fato de que a Farmacopeia dos EUA está atualmente tentando expandir sua presença internacionalmente. Representantes do México estavam presentes no evento mencionado, incluindo autoridades do Cofepris — especificamente, a Comissária Esther Ruiz, de Evidências e Gestão de Riscos — e membros da indústria, em particular a Associação Mexicana de Laboratórios Farmacêuticos (Amelaf), com seu diretor executivo Juan de Villafranca, que mantém um relacionamento muito ativo há três anos com a USP, cujo CEO, Ronald Piervincenzi, está claramente interessado em abrir a farmacopeia aos países da região. Brasil, Colômbia, Argentina e Peru também estavam presentes.
As prioridades identificadas pela USP em seu ciclo estratégico 2020-2025 transcendem as circunstâncias políticas e focam em desafios estruturais de longo prazo, incluindo:
*Colaboração multilateral: o sucesso da USP reside em sua rede global de reguladores, indústria, doadores e ONGs.
*Reforma estrutural versus protecionismo: Embora o debate sobre a produção local nos EUA esteja ganhando força, a USP vê uma oportunidade de discutir a concentração geográfica da produção e a falta de resiliência em genéricos essenciais, promovendo incentivos que garantam estabilidade.
*Fortalecer a resiliência: Não se trata apenas de resistir a crises, mas também de construir cadeias de suprimentos robustas. Ferramentas como o Medicine Supply Map permitem o mapeamento de riscos em tempo real, ajudando fabricantes e distribuidores a antecipar escassez e diversificar fornecedores. “Evite a dependência excessiva de qualquer região ou fornecedor, como visto durante a pandemia da COVID-19.”
*Estabilização do mercado genérico: A crise de preços dos genéricos afetou a acessibilidade. A USP defende políticas que promovam redundância, qualidade e sistemas de alerta precoce, bem como incentivos para produção confiável.
*Modernização científica e padrões globais: a USP respondeu a desafios como a pandemia, a crise das nitrosaminas (compostos potencialmente cancerígenos em alguns medicamentos, gerando preocupações e exigindo mudanças nos processos de fabricação) e novos desafios de saúde com padrões desenvolvidos em tempo recorde. Seus laboratórios modernizados e liderança em terapias avançadas (terapia gênica, biossimilares) e química verde consolidam sua atuação em mais de 155 países.
*Fortalecimento das capacidades globais: por meio de parcerias com a USAID, a Unitaid (uma agência global de saúde patrocinada pela OMS que busca inovar e acelerar o acesso a tratamentos, diagnósticos e ferramentas de saúde para países de baixa e média renda) e reguladores, a USP treinou mais de 100.000 cientistas e apoiou projetos de fabricação localizados na África, promovendo a autossuficiência em regiões vulneráveis.
*Digitalização e Manufatura 4.0: A adoção de tecnologias modernas e processos digitalizados permitiu à USP alcançar agilidade operacional.
*Engajamento e defesa do paciente: a USP reconhece a voz dos pacientes como essencial para fechar lacunas com o setor e reformar políticas de compra que priorizam a resiliência em detrimento do preço.
A mensagem da USP foi clara: o futuro não se constrói com base no protecionismo, mas na colaboração, na agilidade e no compromisso coletivo com a resiliência.
Amelaf; Proximidade com a USP abre portas para empresas farmacêuticas mexicanas nos EUA
Entrevistado na Convenção da USP, Juan de Villafranca, da Amelaf, destacou a virtude da USP em ser uma das poucas farmacopeias independentes da agência reguladora, embora atue em conjunto com o FDA, e também que sua estrutura vem se fortalecendo além das fronteiras dos EUA, como a do México, onde atua há três anos, o que ajuda a promover ainda mais os laços entre as agências reguladoras dos dois países.
Eleconomista