Como a sede de fama de James Corden o 'separou' de Ruth Jones: e-mails sinceros revelam como os criadores de Gavin and Stacey 'terminaram' depois que ele foi para Los Angeles em busca da vida de celebridade.

Assim como todo mundo, fiquei encantado com Gavin and Stacey, criado por Ruth Jones e James Corden , quando estreou em maio de 2007.

A série teve 22 episódios, incluindo especiais de Natal muito aguardados. O episódio final, em dezembro passado, atraiu 21 milhões de telespectadores – números não vistos desde o auge de Morecambe and Wise.

Quando começaram a filmar os episódios finais no sul do País de Gales, centenas de pessoas acorreram aos locais de filmagem, sendo mantidas afastadas por seguranças. Os paparazzi estavam em peso, importunando o elenco. Por medo de que elementos da trama vazassem, as ruas tiveram que ser bloqueadas para as filmagens.

A premissa, porém, era de uma simplicidade absoluta: um rapaz de Essex com ar jovial (Mathew Horne) e uma garota exuberante de Barry Island (Joanna Page), na era anterior ao Facebook e às redes sociais, se conhecem conversando ao telefone no trabalho. Eles se encontram em Londres e se apaixonam instantaneamente. Ao longo das várias temporadas, casam-se, compram uma casa, criam filhos... tudo muito normal e previsível.

Para apimentar as coisas, tínhamos Nessa, interpretada por Ruth Jones – supostamente uma contrabandista e motorista de caminhão que certa vez foi para a cama em Las Vegas com dois dos Pips de Gladys Knight – e Smithy, interpretado por James Corden, o melhor amigo exuberante de Gavin. Eles formavam um casal gloriosamente incompatível. Continuávamos assistindo para ver se eles conseguiriam superar suas próprias peculiaridades consideráveis.

Este livro, feito sob medida para os fãs, é uma transcrição (do jornalista Boyd Hilton) de uma longa e franca conversa entre Jones e Corden, intercalada com memorandos de produção manchados de café, rascunhos, esboços de propostas e rabiscos, incluindo erros de ortografia e tipográficos.

A obra aborda em detalhes a gênese e a evolução do programa. Também ficamos sabendo muito — talvez até demais — sobre a relação profissional e pessoal dos autores.

Jones e Corden se conheceram durante as gravações de uma sitcom chamada Fat Friends, sobre um clube de emagrecimento. "Achei você muito simpático, doce e muito jovem", disse Jones a Corden. Tomando uns drinques no hotel do elenco em Leeds, eles decidiram tentar escrever um programa próprio – tinham ideias vagas sobre galeses encontrando ingleses em uma festa ou recepção de casamento.

Aos poucos, tudo foi se encaixando: os Shipmans, os Wests, seus vizinhos, os Sutcliffes: todos com nomes de assassinos em série; Billericay versus Barry.

A ITV rejeitou o projeto por considerá-lo de pequena escala. Eles não o viam como algo "convencional". No entanto, um editor de programação da BBC afirmou, em junho de 2005: "Acho que pode ser uma das melhores coisas que já fizemos."

Corden, que nessa altura já se apresentava em The History Boys na Broadway, mostrou o que tinham escrito a Alan Bennett, que ficou "cheio de elogios aos guiões". Corden e Jones admitem que existe, de facto, uma influência de Bennett – "muito desse tipo de coisa do dia a dia. Só que não dita com sotaque de Yorkshire".

Jones, a datilógrafa, digitava tudo em documentos do Word. Corden rabiscava em post-its. Houve muitas risadas, lágrimas, lanches e chocolate. Todas as manhãs, no escritório, eles começavam dizendo: "Imagine se..." e então embarcávamos em um voo de fantasia.

Eles se encontravam frequentemente em Nova York. "Era surreal escrever essas cenas ambientadas em Barry Island enquanto estávamos sentados no Central Park."

A série recebeu sinal verde e as decisões sobre o elenco puderam ser tomadas. Rob Brydon era ideal como o pedante Tio Bryn. Julia Davis era Dawn, a vizinha da porta ao lado.

Alison Steadman, no papel de Pam, a mãe de Gavin, estava sublimemente excêntrica. Depois de ter dito a todos que era vegetariana, ela é flagrada por Stacey devorando um pacote de presunto: "Prometa que não contará isso a ninguém!" "Mas é presunto, Pam!"

O melhor de tudo foi Nessa, interpretada por Jones, com sua peruca preta de corte chanel, delineador carregado e vestindo muito couro – o tipo de mulher durona cujas expressões são instantaneamente reconhecíveis para aqueles de nós que cresceram nos vales do sul do País de Gales: "Não estou brincando, não me entenda mal, tenho que ser honesta com você, no fim das contas, se falar a verdade, sem mentira nenhuma..." A pergunta de Nessa, "O que está acontecendo?", tornou-se um bordão instantâneo.

Jones não tem dúvidas sobre o que fez do programa um sucesso: "É sobre amizade, família, risos e amor, e são essas coisas que realmente nos mantêm motivados."

Como Corden acrescenta: "A alegria é a moeda corrente do programa", o que é verdade mesmo quando há tensão.

Stacey detesta a vida de casada em Essex e insiste em voltar para o País de Gales todos os fins de semana, mesmo sendo uma longa viagem e com um trânsito infernal; Smithy, que pode ser mal-humorado e imaturo, não gosta da mudança de Gavin, de amigo íntimo para marido dedicado: "Seu telefone está desligado há semanas", reclama ele, quando Gavin está em lua de mel.

Todos têm dificuldade em se adaptar. O "pequeno príncipe" de Pam agora pertence a outro lugar. E, claro, Nessa engravida.

O público ficou extasiado. "Foi algo realmente fascinante... Mudou minha vida", disse Corden.

É aqui que o livro fica interessante. Corden apreciava a fama e a capitalizava. Jones não.

"Acho que nós dois experimentamos a fama de maneiras diferentes", diz Corden com cautela. Ele foi para Los Angeles para apresentar programas de entrevistas premiados com o Emmy. Os americanos adoravam sua arrogância. "Tive momentos incríveis e ótimos", admite.

Jones, de forma mais modesta, voltou para Cardiff. "Passei a maior parte do tempo no País de Gales e realmente lutei contra a fama." Ela detestava os compromissos no tapete vermelho, não gostando de parecer arrumada e acima do peso nas fotos da imprensa.

Quando Corden a visitou, as pessoas buzinavam animadamente para ele – Jones passou despercebida. O enorme status de celebridade de Corden "de certa forma nos separou", diz ela – um ponto que é constantemente reforçado: "Acho que tive dificuldade em lidar com aquele mundo em que você estava inserido porque sentia que isso nos separava". Deve ter havido também um enorme abismo financeiro.

Embora Jones deva se orgulhar de sua atuação como Hattie Jacques em uma cinebiografia e dos 58 episódios de Stella na Sky, é preciso reconhecer que Llanbradach e St Mellons, onde a série foi gravada, não são Beverly Hills, onde Corden estava no auge de sua carreira apresentando o Carpool Karaoke com Will Smith e Gwyneth Paltrow.

Apesar disso, a admiração mútua soa um tanto vazia: "Não sei se as pessoas algum dia perceberão o quanto nós dois realmente dizemos 'eu te amo'", é um comentário típico.

"Você entrou e, quando te vi, simplesmente desabei em lágrimas. Fiquei tão feliz em te ver", lembra Corden sobre o fato de Jones ter comparecido à sua festa de aniversário. Ao que Jones responde: "É muito estranho, porque acho que nem sempre percebo o quanto você me ama". (Devemos presumir que nada disso é físico – é tudo demonstração de afeto.)

Mais sincero é um e-mail de Corden para Jones em 2015: "Sinto que você está chateada comigo ou algo assim, ou que não me considera mais uma amiga." E aqui está Jones para Corden em 2017: "Estamos em momentos tão diferentes." Como ela acrescenta agora neste livro: "Você alcançou o estrelato, em termos de fama... Acaba havendo uma certa disparidade."

Eles fizeram o possível para se realinhar. "Sua atuação é uma das melhores de todos os tempos", diz Corden a Jones, o que significa que ele acha que Nessa pode ser comparada a Elizabeth Taylor como Cleópatra ou Vivien Leigh como Blanche DuBois.

No último dia de filmagem do especial de Natal do ano passado, "provavelmente foi o set de TV ou cinema mais emocionante em que já estive... Todos estavam se abraçando e cantando". Que gente emocionalmente incontrolável são os atores e atrizes.

Recentemente, foi divulgado que Corden e Jones receberão milhões para colaborar em uma série de dez episódios para a Apple TV sobre um coral comunitário local.

Jones também está trabalhando com Steve Speirs, seu colega de elenco em Stella, em um drama da BBC sobre pacientes em uma clínica de trauma no joelho. Há muito potencial para comédia em todos esses projetos.