Selecione o idioma

Portuguese

Down Icon

Selecione o país

Portugal

Down Icon

Economia. Tempos de incerteza

Economia. Tempos de incerteza

A economia poderá vir a desacelerar no terceiro trimestre, apesar do bom arranque do ano. O alerta é da presidente do Banco Central Europeu (BCE), Christine Lagarde, justificando este comportamento com a incerteza à volta das tarifas e o seu impacto, apesar do recente acordo comercial entre a União Europeia e os EUA, que permitiu evitar um cenário de tarifas mais elevadas, mas deixando ainda em suspenso alguns setores estratégicos, como o farmacêutico, que o BCE terá em conta nas suas próximas decisões. Um receio que é partilhado pelos economistas ouvidos pelo Nascer do SOL.

«A desaceleração parece bastante plausível, embora isso possa querer dizer coisas muito diferentes. A incerteza é o pano de fundo, o que realmente não diz nada de definido. Apenas que não sabemos», explica João César das Neves, para quem «toda esta saga das tarifas é um gigantesco disparate, gerado por pura ignorância –os argumentos utilizados foram refutados no século XVIII – e ninguém sabe sequer que tarifas vão realmente ser aplicadas». Ainda assim, o economista admite que, «em qualquer caso, no meio da incerteza, uma coisa é certa: nenhuma economia vai ganhar e a principal vítima será a economia americana».

Também para o economista do Banco Carregosa Paulo Monteiro Rosa, o alerta do BCE deve ser entendido como um sinal de prudência perante a evolução da economia da Zona Euro. «Apesar de um início de ano positivo, Christine Lagarde sublinhou que já se antecipam sinais de abrandamento no terceiro trimestre. Esta inferência reflete não só a incerteza do contexto internacional, marcada sobretudo pelas tensões comerciais e geopolíticas, mas também pelo impacto interno de uma procura mais fraca em alguns setores», diz Monteiro Rosa ao nosso jornal, frisando que «o BCE procura, assim, preparar não só os mercados, mas também todos os agentes económicos, especialmente empresas e famílias, para uma fase de crescimento mais moderado, mantendo ao mesmo tempo a confiança, referindo que dispõe de instrumentos para responder caso a situação se agrave».

Esta incerteza perante a evolução da inflação, do crescimento económico e do comércio internacional será tida em conta pelo BCE antes de avançar com novas decisões de política monetária. «Para o BCE, esta incerteza significa que as perspetivas económicas permanecem frágeis, uma vez que novas medidas protecionistas ou ajustes nas tarifas podem influenciar diretamente a competitividade das empresas europeias, os fluxos comerciais e, em última análise, a evolução da inflação. Por isso, Lagarde salientou que este fator será tido em conta nas próximas decisões de política monetária», acrescenta.

Metas poderão estar comprometidas

Se a desaceleração da economia da Zona Euro se confirmar no terceiro trimestre, é natural que as metas económicas para Portugal poderão, de facto, ser postas em causa.

Paulo Monteiro Rosa lembra que, «sendo um país fortemente integrado nos mercados europeus, Portugal é particularmente sensível a quebras na procura externa, nomeadamente nas exportações de bens e serviços, como o turismo e a indústria transformadora».

E os riscos não ficam por aqui. Segundo o economista, a incerteza em torno das tarifas comerciais e o abrandamento global podem afetar o investimento e a confiança das empresas.

Ainda assim, mostra-se otimista: «A resiliência demonstrada até agora, assente sobretudo num mercado de trabalho dinâmico, impulsionado pelo aumento da população empregada em cerca de 15% desde 2013, no turismo, no investimento estrangeiro, e no recurso a fundos europeus, pode ajudar a atenuar os efeitos mais negativos e a manter, pelo menos em parte, os objetivos económicos delineados pelo executivo português».

Também António Nogueira Leite, em entrevista ao Nascer do SOL, já tinha reconhecido que se antecipava «um crescimento relativamente modesto, como tem sido modesto em Portugal e ainda mais modesto no centro da Europa». E justificou: «Parece que todos baixámos o nosso grau de ambição na Europa porque hoje em dia já ficamos contentes com uma taxa de 2%».

Nogueria Leite lamenta o facto de Portugal ter deixado para trás a ambição de se aproximar dos melhores exemplos na Europa. «Às vezes, o Presidente da República exultava com um crescimento de 2%. Ora, 2% não é nada porque continuamos a uma distância grande dos países do centro da Europa e aquela ambição que era quase unânime em Portugal há 30 anos de que nos devíamos ir aproximando da Europa, agora, nota-se que não é um objetivo mobilizador. Agora, estamos mais numa ambição de sobrevivência, de resolução de grandes problemas que se foram acumulando».

Atenções viradas para o Orçamento

O alerta do BCE sobre a possível desaceleração da economia europeia, no entender do economista do Banco Carregosa, obriga Portugal a preparar-se para um enquadramento externo menos favorável, podendo, assim, ter impacto nas exportações, no investimento e na receita fiscal. Face a esse cenário, «espera-se que o Governo adote uma postura mais prudente, reforçando medidas de resiliência orçamental, mas também assegurando apoios seletivos aos setores mais vulneráveis», afirma.

Ao mesmo tempo, Paulo Monteiro Rosa diz ser «importante manter espaço para o investimento público estratégico, nomeadamente através dos fundos europeus, que permita sustentar o crescimento mesmo num contexto de menor dinamismo económico».

Menos otimista em relação ao rumo que será tomado pelos partidos políticos está César das Neves, para quem a discussão do próximo Orçamento «será, também, um fator de incerteza, sendo a peça principal da tragicomédia partidária em que estamos envolvidos». E acrescenta: «Aquilo que o Orçamento deveria contemplar é a menor das preocupações dos debates e dos atores».

Já Nogueira Leite confessa que gostaria que Portugal conseguisse «ter boas contas sem necessidade de subterfúgios». No entanto, reconhece que é um objetivo difícil de alcançar, «até porque em 2024 houve aumentos de muitas classes no funcionalismo público» que se traduz em aumentos permanentes da despesa. «Vamos ter de ter algum cuidado nessa questão e, por isso, não falo em baixas de IRS porque não acho que haja margem para fazer. Adorava. Temos uma carga fiscal brutal, mas não acho que haja grande margem. A aposta e já digo isso há imensos anos, mas sem qualquer sucesso, está em melhorar o funcionamento dos serviços e conter a despesa por essa via», salienta.

César das Neves lembra que «as últimas eleições demonstraram que os portugueses estão um bocadinho fartos de que haja turbulência cada vez que temos um Orçamento», referindo que o «resultado foi dramático para quem quis esticar a corda». Já em relação à posição do Governo de não quer escolher à partida um negociador exclusivo, parece-lhe «razoável», até porque, caso contrário, a exclusividade«dava muito poder a esse negociador».

Jornal Sol

Jornal Sol

Notícias semelhantes

Todas as notícias
Animated ArrowAnimated ArrowAnimated Arrow